Surfistas de São Paulo sofrem com o despejo irregular de esgoto nos últimos 10 anos
Por: João Malavolta
O verão chega e com ele também vêm os dias mais longos, água quente, finais de tarde com aquele pôr-do-sol incrível, além de horas e mais horas de surfe até o anoitecer. Essa sem duvida é a realidade para muitos surfistas que moram ou frequentam o litoral nessa época do ano, e que vivem isso como o melhor desse estilo de vida que o esporte possui.
Mas toda essa realidade que aparenta ser perfeita e recheada de positividade, hoje em dia, esta ficando cada vez mais comprometida devido às agressões que a zona costeira vem sofrendo pela contaminação dos seus ambientes com resíduos sólidos e derramamento de esgoto nas praias.
Se não bastasse a alta produção de lixo que não é reciclado e que por muitas vezes acabam se alojando na areia ou mesmo na água do mar, construções irregulares na faixa de praia e esgotos criminosos afetam os (8) mil quilômetros do litoral brasileiro, e mostram o tamanho do desafio que o País deve enfrentar para resolver problemas socioambientais complexos, que implicam males à saúde das populações que vivem e curtem seu lazer junto ao mar.
No estado de São Paulo os números da poluição em 2010 impressionam. De acordo com os dados oficiais do Relatório Anual de Qualidade das Praias Litorâneas da CETESB - Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental, o Litoral Norte
teve cerca de sete (7) em cada dez (10) praias, os mais altos indicies de poluição, ou seja, dos 83 pontos de medição que são analisados pelo órgão naquela região, apenas 29% estiveram próprios o ano todo, e a cidade de Ubatuba se destaca com duas praias impróprias na maior parte de 2010: Perequê Mirim e Itaguá,conforme os estudos.
Já na Baixada Santista as condições da balneabilidade permaneceram com uma pequena melhora se comparado os dados dos anos anteriores. Conforme o relatório, esse é o trecho do litoral paulista que possui o maior número de praias consideradas impróprias para banho de acordo com o balanço anual do órgão medidor.
A cidade de Praia Grande historicamente é a líder em problemas de saneamento, e o Guarujá surge como o município que voltou a melhorar a sua balneabilidade nesses últimos anos, como no inicio desta década, em que das 11 praias da cidade que recebiam a classificação apenas uma estava imprópria, a Praia do Perequê.
Conforme estes dados o litoral paulista ainda tem muito que melhorar quando o assunto é a qualidade das águas litorâneas. Para a bióloga pós-graduada em gestão e controle ambiental Ericka Friol, o estudo demonstra que todos esses problemas surgem pela falta de planejamento na ocupação da área costeira.
“Devido o nosso litoral na maioria do seu território ter sido povoado sem planejamento e muitas vezes de maneira irregular, falta saneamento bem estruturado para cada cidade, pois por questões físicas e geomorfológicas temos ambientes bem diferentes uns dos outros, e desta forma cada localidade deveria ter o seu projeto de saneamento que atendesse as características socioambientais do lugar sem comprometer a qualidade das praias”.
De acordo com a Bióloga esses problemas só se resolvem com investimentos públicos e melhora na educação das populações. “As pessoas devem primeiramente entender como os projetos de saneamento são elaborados e funcionam, para posteriormente apoiar na gestão, além disso, deve haver uma parceria entre o estado, municípios, universidades e sociedade civil para que cada parte interessada possa auxiliar no controle social desse sistema complexo, o saneamento básico.
Quem vai surfar num mar de poluição? A resposta para essa pergunta hoje em dia, deve fazer parte do quê é discutido nas rodas de conversa dos surfistas pelo litoral.
A questão essencial que tem que ser destacada quando o assunto é o lixo e a contaminação das águas marinhas por lançamento de esgoto “in-natura”, é como surgem esses problemas e onde afetam no dia-a-dia de quem pega onda.
Em entrevista, o surfista do Guarujá Junior Faria, comenta suas impressões sobre a qualidade das praias e da água nos litorais do mundo, e afirma se assustar com tanto desrespeito ao meio ambiente nos picos de surfe.
O atleta que figura na elite do surfe brasileiro e mundial afirma que a contaminação da água do mar por lançamentos irregulares de esgotos fatalmente afeta a saúde dos surfistas pelo grande período de tempo que permanecem surfando. “Todas as partes do nosso corpo ficam cobertas pelo mar, algumas vezes até ingerimos água mesmo sem querer, portanto qualquer nível de poluição irá nos afetar de algum forma”, explica.
Atualmente um dos principais fatores que sobrecarregam a capacidade do saneamento ambiental nos litorais do mundo, esta diretamente associado ao aumento exponencial da população que mora nas zonas costeiras, o qual não vem acompanhado de investimentos públicos em coleta e tratamentos sanitários, além das ocupações irregulares em toda costa, que acentuam o problema e impactam todos os ambientes naturais. O surfista explica o caso do Guarujá com algumas reservas sobre os dados do Governo de São Paulo, que afirmam que a cidade obteve melhoras na qualidade de suas praias.
“Gostaria muito de saber exatamente o que o poder público tem feito para alcançar tais melhorias. O quê observo, é que o esgoto continua fluindo nas principais praias da nossa Ilha e o estado da orla é lastimável, nem serviços básicos como lixeiras na beira da praia se encontram em boas condições de uso”.
Segundo o atleta, quem está dando o exemplo quando o assunto é atitude para preservar o litoral é a sociedade civil organizada. “As iniciativas mais louváveis partem da galera local que organiza mutirões de limpeza nas praias. Posso citar a Associação de Surfe do Guarujá e a comunidade de surfistas locais da Praia do Tombo que inúmeras vezes organizaram ações de limpeza por conta própria”, ressalta.
O surfista também faz um alerta comentando que o problema da poluição no mar não é exclusivamente um fato que acontece só no Brasil.
Em viagens pelo mundo em busca de ondas perfeitas, muitas vezes o surfista encontra a paisagem comprometida com a contaminação dos ambientes pelas mais diversas formas de poluição. “Por incrível que pareça, as praias mais poluídas que já vi na minha vida foram às praias das Ilhas Maldivas. Encontrar uma quantidade tão grande de lixo num lugar tão abençoado foi um choque. Praticamente toda a faixa de areia ao redor de algumas ilhas que conheci por lá estavam tomadas pelo lixo. De tampas de privada, brinquedos e calçados até o clássico saco plástico. Tinha de tudo. Mas o que mais doía era ver a tripulação do barco em que estávamos hospedados, despejar todo o lixo produzido pela embarcação em alto mar, sem cerimônia”.
O atual representante do Brasil no circuito mundial de surfe profissional ainda garante que a comunidade do surfe pode fazer muito mais pelo cuidado com as praias, mares e oceanos.
“Acredito que poderíamos fazer mais, pela importância do mar em nossas vidas, deveríamos nos preocupar com a qualidade da água do mar do quê com a qualidade da bermuda que vamos vestir para surfar”, reflete.
Movimento #Praia Sem Esgoto
O Governo Estadual paulista iniciou em 2007 o programa Onda Limpa da Sabesp, que deveria significar recuperação ambiental no litoral, mas está sendo sinônimo de manobras políticas ilegais, de impacto ambiental, de falta de transparência e de má utilização de recursos públicos.
Em Itanhaém, o projeto instalou clandestinamente uma rede coletora de esgoto na areia da praia com bueiros de concreto, que vem prejudicando a qualidade ambiental do lugar pelo vazamento a céu aberto de poluentes, além do forte cheiro, que assombra quem pega onda nas praias da região.
Para combater tal crime e possibilitar uma reflexão regional sobre como andam as praias de São Paulo, foi criado o Movimento #PRAIASEMESGOTO.
A ação nasce como um movimento social regional, apartidário, composto por organizações sociais e cidadãos dispostos a mobilizar-se contra os danos socioambientais que o Programa Onda Limpa, da Sabesp, está deixando no litoral do Estado.
Para um dos coordenadores do Grupo de Trabalho de comunicação do movimento o Educador Ambiental Bruno Pinheiro essa ação está sendo um grande catalisador de parcerias entre a sociedade civil organizada, poder público e cidadãos.
“O movimento provocou de maneira rápida e nunca vista, quando o assunto é mobilização social, uma atitude positiva do poder público em resolver o problema da instalação de redes de esgoto na faixa de areia das praias da cidade de Itanhaém, haja visto, que através do movimento Praia Sem Esgoto a Sabesp está sendo obrigada pela Secretária do Patrimônio da União (SPU), a retirar toda a rede coletora de esgoto da areia das praias itanhaenses”.
De acordo com Pinheiro o Movimento é solidário também com moradores de todas as cidades do litoral brasileiro que sofrem com o despejo de esgoto na praia ou cujo serviço público é mal oferecido à população.
“Hoje podemos convergir idéias e atitudes afins entre as pessoas de todas as partes do Brasil e do mundo. Uma das forças nessas questões são as redes sociais como o Facebook, Blogs, Youtube, que servem para que todos possam expressar suas indignações frente a questões críticas que fazem parte desse contexto público”.
Para saber mais acesse:
www.praiasemesgoto.blogspot.comC
omo saber mais sobre a qualidade das praias no litoral paulistaA informação sobre a balneabilidade das praias é fundamental para que a população conheça as condições de uso das principais praias do Estado.
A divulgação das condições de balneabilidade é feita através da emissão de um boletim semanal, que é enviado para todas as prefeituras do litoral, órgãos de saúde e meio ambiente, órgãos envolvidos com turismo e a imprensa em geral.
Além disso, a CETESB possui atendimento telefônico gratuito (0800-113560) que informa diariamente sobre as condições das praias. E possível, ainda, obter essas informações acessando o site
www.cetesb.sp.gov.br, entrando no item água e, em seguida, no mapa de qualidade das praias. Basta clicar no nome do Município desejado e a listagem de suas praias aparecerá, mostrando as respectivas condições de balneabilidade, representadas por uma bandeira à direita do nome da praia.
Nas praias monitoradas existem bandeiras de sinalização indicando as condições de balneabilidade se a bandeira for verde a praia está própria se for vermelha a praia está imprópria. (Fonte:
www.cetesb.sp.gov.br)